Friction – Trecho – A evolução do monitoramento de barragens de rejeitos ao redor do mundo
Originalmente escrito por Paul Davies, Gerente Comercial, Australásia na GroundProbe e publicado em Friction
Os métodos de monitoramento de barragens de rejeitos utilizados pela indústria de mineração evoluíram ao longo dos anos com os avanços na tecnologia, IA, pesquisa e desenvolvimento. Neste artigo, Paul Davies da GroundProbe discute a abordagem de prevenção de desastres em barragens de rejeitos com o especialista Leo Probst. Aqui, eles refletem sobre catástrofes anteriores em barragens de rejeitos e como os novos avanços tecnológicos podem garantir um nível de segurança ideal e reduzir riscos para os mineradores e as comunidades vizinhas.
Conversamos recentemente com Leo Probst, engenheiro geotécnico sênior do setor de pesquisa e desenvolvimento da GroundProbe, sobre o que o setor aprendeu nos últimos anos em relação ao monitoramento de barragens de rejeitos desde o colapso fatal da barragem da Samarco no Brasil, ocorrida em 2015.
Leo possui muitos anos de experiência na indústria em diversas minas na América do Sul. Atualmente, ele trabalha no suporte à pesquisa e ao desenvolvimento de novos produtos para monitoramento de barragens de rejeitos. Antes de entrar para a equipe GroundProbe em 2019, Leo já era um usuário da nossa tecnologia, e continua trabalhando para ajudar no avanço do monitoramento de barragens de rejeitos.
Durante nossa conversa, analisamos como a indústria vem mudando com a inclusão de novas tecnologias e sistemas para auxiliar na redução de risco para os mineradores. As principais conclusões são as seguintes:
- As barragens de rejeitos podem ter estruturas complexas e exigir um grau maior de monitoramento do que se pensava anteriormente;
- É preciso implementar sistemas capazes de analisar tendências a curto e longo prazo, incluindo a integração de relatórios com o plano de ativação de ações de resposta (TARP) da mina;
- Uma infraestrutura robusta e fortes sistemas de comunicação são essenciais para possibilitar a tomada de decisões pelos mineradores no tempo necessário. As comunidades podem sofrer impactos negativos quando os sistemas de monitoramento são insuficientes.
Primeiro exemplo: O colapso da barragem da Samarco em 2015
O rompimento da barragem da Samarco, também conhecido como desastre da barragem de Mariana, ocorreu em 5 de novembro de 2015 no Brasil. Foi um desastre ambiental catastrófico causado pelo rompimento da Barragem de Fundão, uma barragem de rejeitos de minério de ferro localizada próximo à cidade de Bento Rodrigues, no estado de Minas Gerais.
O que ocorreu:
- Cerca de 32 milhões de metros cúbicos de lama tóxica extravasaram na cidade vizinha de Bento Rodrigues e várias outras comunidades rio abaixo.
- O acidente causou a morte de 19 pessoas e foi um dos maiores desastres ambientais da história do Brasil.
- As empresas de mineração envolvidas foram altamente responsabilizadas legal e financeiramente.
Segundo exemplo: colapso da barragem de rejeitos de Brumadinho, em 2019
O rompimento da barragem de rejeitos de Brumadinho foi um evento catastrófico que ocorreu em 25 de janeiro de 2019 no Brasil. Até hoje, este foi o desastre de mineração com o maior número de vítimas da história do país.
O que ocorreu:
- O colapso da barragem causou o extravasamento de 12 milhões de metros cúbicos de lama e resíduos minerais nas áreas próximas.
- O desastre resultou nas mortes de pelo menos 270 pessoas, incluindo mineradores e moradores das áreas vizinhas.
- O desastre gerou muita indignação e consequências legais para as empresas envolvidas. Atualmente, existem regulamentações mais rígidas em vigor e melhor fiscalização das atividades de mineração no Brasil. Os esforços de recuperação após o colapso foram complexos e arriscados devido à instabilidade do terreno e ao risco de novos colapsos.
- O desastre é um alerta sobre os riscos associados às barragens de rejeitos nas operações de mineração e da importância de medidas de segurança mais rígidas, inspeções regulares e salvaguardas ambientais.
Perguntas e respostas: analisando o passado para nos prepararmos para o futuro
Paul: Qual é sua perspectiva em relação aos fracassos no monitoramento de barragens de rejeitos quando comparados aos acidentes em minas a céu aberto?
Leo: Na época, a indústria tinha quase 20 anos de prática no monitoramento geotécnico por radar em minas a céu aberto, mas muito menos tempo de experiência no monitoramento de barragens por radar. Os mecanismos de falha entre os dois tipos de locais são muito diferentes.
Paul: Você considerava o monitoramento de barragens de rejeitos mais arriscado do que o de minas a céu aberto?
Leo: Sim, nós precisávamos considerar se o monitoramento de barragens com radar era um risco muito alto. Por fim, a decisão foi de trabalhar com os clientes e desenvolver soluções para suas necessidades.
Havia espaço para melhorias na forma como as estruturas das barragens estavam sendo monitoradas. Não dava para emprestar as técnicas comprovadas que funcionavam em minas a céu aberto e aplicá-las em barragens de rejeitos. Ambas possuíam diferentes mecanismos de falha, e a tecnologia disponível na época nem sempre era adequada.
Paul: Você pode dar um exemplo dessas diferenças?
Leo: Claro. Na época, algumas pessoas acreditavam que as falhas ou acidentes em barragens de rejeitos ocorriam sem sinais precursores. Agora já está claro que existem indicativos precursores evidenciados na estrutura antes do colapso.
Geralmente, o método tradicional consistia em coletar os dados de monitoramento semanalmente, mensalmente ou semestralmente. As tecnologias não conseguiam fornecer as informações de que precisávamos. Começamos a desenvolver procedimentos melhores para monitorar barragens de rejeitos a fim de entender os riscos e monitorar o projeto para áreas amplas, de deformação lenta e a longo prazo.
Antigamente, o monitoramento das barragens de rejeitos em tempo real não era algo comum. As leituras por satélite InSAR (Interferometria por Radar de Abertura Sintética) eram realizadas a cada 11 dias. As medições de sensores subterrâneos também eram periódicas. Assim, eram necessários meses de coleta para produzir um relatório. Esses relatórios forneciam análises retroativas, mas eram insuficientes para capturar mudanças rápidas.
Uma barragem que se mantém estável a longo prazo pode sofrer alterações e passar por uma ruptura rápida e veloz. As barragens de rejeitos a montante são ainda mais arriscadas. A solução precisa abranger tanto a situação em tempo real quanto a longo prazo.
Paul: Como vocês desenvolveram uma solução?
Leo: Nós abordamos o problema de duas formas. Em primeiro lugar, instalamos sensores capazes de realizar medições com maior frequência. Por exemplo, os SAR (radares de abertura sintética) de instalação no solo e outros sensores.
Também providenciamos mais ferramentas de análise para avaliar tendências de longo e curto prazo. Isso nos permite agir rapidamente se algo der errado.
Ao contrário das minas a céu aberto, onde a solução seria óbvia, cada barragem de rejeitos requer uma abordagem individualizada para abarcar tanto as situações de condições críticas quando as de longo prazo. A integração dos relatórios dos sensores com o TARP pode nos ajudar a gerenciar a combinação de riscos e a confirmar estas tendências.
Paul: Como essas mudanças afetaram as operações da mina?
Leo: Esse é um ponto muito importante que merece destaque. Aprendemos a importância de entender a infraestrutura de comunicação que sustenta uma barragem de rejeitos. Foi um desafio, porque as barragens de rejeitos são isoladas e não contam com fornecimento de energia ou comunicações.
Paul: Como transmitir dados de um sensor de alta definição, preparar os dados de forma útil e, em seguida, comunicar essas informações para que os operadores possam tomar uma decisão calculada para gerenciar seus riscos?
Leo: O sistema de coleta e transmissão desses dados precisa ser robusto e não pode sofrer interrupções de modo algum.
Paul: Imagino que, se o cliente perder a comunicação com seus dados, o impacto será considerável.
Leo: Com certeza. Iniciamos o monitoramento após o colapso que ocorreu há dois anos na América do Sul. Havia o risco de que uma pilha seca de material afetasse a infraestrutura da comunidade na região externa próxima à mina, causando grandes transtornos.
Esse colapso contou com uma complexidade a mais, que foi a interrupção do fornecimento de energia. Os radares não foram afetados, pois eles dependem de fontes de alimentação autônomas. No entanto, os meios de comunicação com a mina seriam desligados. Nossa equipe não podia fornecer monitoramento 24 horas. Então, providenciamos uma pessoa no local com uma fonte de energia para garantir a continuidade do monitoramento.
Paul: Alguma consideração final?
Leo: Atualmente, existem vários agentes trabalhando em conjunto. A diversidade de fornecedores é um aspecto positivo, porém torna as coisas mais complexas. Todo mundo está conectado – incluindo os mineradores, autoridades reguladoras, governos, comunidades e fornecedores. Todos nós podemos aprender algo.
Conclusão
É importante fornecer apoio à comunidade local. Quando há comunidades de moradores próximas aos locais de mineração, essas pessoas precisam de suporte para saber como evacuar o local corretamente.
Por exemplo, o TARP (plano de ativação de ações de resposta) para uma barragem de rejeitos pode exigir a coordenação de toda uma comunidade, ou até mesmo de toda uma cidade em caso de alerta de emergência. Essas evacuações costumam ser mais complexas do que as realizadas em minas a céu aberto, onde apenas os mineradores precisam evacuar. Há também as consequências de alarmes falsos (ou indesejados) que podem causar grandes transtornos nas comunidades.
Agora, as autoridades reguladoras podem verificar as condições diretamente utilizando o InSAR sem sensores no solo. No final do processo, as informações ficam disponíveis online e podem ser acessadas por qualquer pessoa – mineradores, autoridades reguladoras e comunidades. Qualquer indivíduo pode conferir os dados e utilizar as informações fornecidas.
Uma última reflexão: acreditamos que a Internet das Coisas (IoT) é o futuro de todos os aspectos relacionados às barragens de rejeitos. Precisamos ampliar nosso conhecimento sobre o comportamento dessas estruturas para garantir estabilidade e segurança geral para os mineradores e as comunidades.
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Acima: O rompimento da barragem de rejeitos de Brumadinho, 2019
Photo Source: Por Ibama do Brasil – Brumadinho, Minas Gerais, CC BY-SA 2.0. |
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Acima: O rompimento da barragem da Samarco, 2015 | |